Christopher sorriu, um tanto quanto sarcástico. Estava a
metros de segurança das ameaças contidas pelos fortes braços de seus seguranças
encantados. Esperava por alguma reação exagerada, é claro, mas não imaginou que
seria tão imediata, intensa e divertida como estava sendo.
— Acho melhor você esperar sua estação chegar para isso, Timothy.
Faltam apenas duas semanas, seja razoável. — Então abriu ainda mais o sorriso,
para provocar seu ‘adversário’ ao limite. — Eu só dei a ele o que mais queria.
Realizei o desejo, não me venha com seus rompantes infantis agora.
— Seu grande filho da puta! — Gritou ainda mais forte, e
toda a ‘sala do trono’ esquentou e se iluminou com a luz do sol. — Ele é meu
filho! Meu filho!
Nesse momento tudo aconteceu rápido demais. Em um instante
Timothy estava sendo segurado por dois seguranças visivelmente mais fortes que
ele, no seguinte ele havia aplicado algum elaborado e estranho golpe que o
libertara. Um dos seguranças acabara no chão com um braço quebrado, o outro sacou
a arma, e atirou na perna esquerda do Solar, o que não pareceu surtir muito
efeito. Novos golpes rápidos e impiedosos levaram esse segurança também para o
chão, com o nariz arrebentado, o joelho estourado e a arma já nas mãos de Tim.
— Você não quer fazer isso, veranista. — Disse o Olhos
Purpuras diante da mira da arma. — Esse é meu tempo! Meu reinado!
No momento que o gatilho foi pressionado os olhos do demônio
emitiram uma luz ainda mais forte, afastando a luz solar do ambiente e banhando
tudo com a cor do tempo. A bala nunca saiu, a arma estourou e se inutilizou,
queimando a mão do veranista e desnorteando-o por algum tempo.
— Você não me deixa outra escolha. — Disse o diabólico líder
da primavera enquanto retirava um atiçador da lareira e o preparava como uma
arma para lidar com o agressivo Tim. — Eu sou seu rei! E a ofensa contra mim é
uma ofensa contra todo o feudo. Você jurou lealdade!
— Para o inferno com o juramento! — Ele se recuperou na
medida do possível, e usando a mão boa concentrou seu calor e sua luz, invocando
a benção máxima do poder ofensivo do verão. — Pago o preço por mata-lo com
orgulho e em nome da minha honra!
Ele disparou o poder do sol. A força do fogo de toda a sua
ira reunida. Um intenso raio de luz solar que criava lampejos de raios voltaicos
ao queimar o ar em direção a Christopher. Esse dançou, com graça e suavidade
que contrastavam com a batalha. O fogo atingiu-lhe parte do braço e perna
direitos, não intensamente o suficiente para fazê-lo parar. Brandiu o atiçador
e golpeou o rosto do veranista com tamanha violência que o som ressoou por toda
a casa.
Tim caiu com um joelho no chão, sua luz enfraqueceu até ser
completamente tomada pela purpura. Sentia os ferimentos arderem, e não ouvia ou
enxergava com o lado direito que fora atingido pelo ferro. Só lhe restava
raiva. Dor. Vingança. A promessa foi quebrada, já não pertencia ao feudo de São
Francisco, as bênçãos daquela terra se voltavam contra ele. Mas ainda havia
raiva, dor e vingança para levanta-lo clamando silenciosamente pela força do
verão dentro dele, sua vida estava completamente arruinada, mas levaria seu nêmeses
consigo para o inferno!
Golpeou o braço de Christopher com força suficiente para
partir-lhe o osso, arremessando o atiçador para longe. Avançou e agarrou o Demônio
da Beleza pelo pescoço, erguendo-o no ar. Sufocando-o. Matando-o lentamente.
Deliciando-se com cada engasgo, cada estalo, cada contorcida de dor.
Dois tiros foram disparados então. O segurança de braço
quebrado parecia bom o suficiente com a mão esquerda. As costas do Solar
sangraram e seus braços se enfraqueceram enquanto soltava o primaveral e
deslizava lentamente de volta ao chão. Ferido demais para se levantar, mas
ainda com gotas de vida o suficiente para dar o gostinho a seu inimigo de
proferir as últimas ofensas.
— Eu não matei seu filho, Tim. Não quis que ele acabasse
morte em nenhum momento. — E dessa vez, enquanto se podia ver os ferimentos
dele desaparecerem rapidamente, como se nem ao menos tivesse sido tocado, ele
não sorriu ou debochou. — Ele sempre desejou a glória dos palcos, queria que
sua música fosse ouvida. Eu o tirei dos bares sujos e festinhas de colegial e o
levei para a parada nacional! Eu dei a ele em dois meses o que não conseguiria
em dois anos se tivesse o dobro do talento que pensava que tinha!
Ele se sentou no chão, pegou a cabeça de Tim em seu colo e
afagou seus cabelos ensanguentados. Quando seus próprios ferimentos haviam
sumido completamente trouxe para si toda a luz purpura de volta. A sala
mergulhara em um silêncio sepulcral, um velório sem choro em nome de seu amigo,
de seu rival, de seu inimigo, de seu campeão. Silêncio quebrado pelo murmúrio do
cantarolar dos lábios de Christopher, da última canção composta pelo filho de
Timothy, a Canção ao Sol. Nunca fora gravada e provavelmente nunca voltaria a
ser ouvida.
— Eu o inspirei. O levei para as melhores gravadoras, vesti
e ensinei sobre a moda, a mídia, o marketing. Eu me deliciei com a adoração que
seus fãs tiveram por sua poesia, por sua melodia! — Ele tirou uma pequena fruta
que lembrava um morango azul, já seca e velha, do bolso do paletó chamuscado.
Colocou-a na boca do moribundo e forçou seu maxilar a mastigar. — Eu o amava
também como um filho, Solar, e como me orgulhava dele! Quando o vi sendo destruído
pelas drogas me partiu o coração... Mas era seu desejo... Deixei-o viver a vida
que sempre sonhou. E morrer no topo, como uma estrala! Ele foi eternizado em
sua forma mais bela, Solar! Orgulhe-se também!
Então ele se levantou. Virou-se de costas, como se olhasse
pela janela atrás de seu ‘trono’. Ninguém nunca se aproximou de Christopher a
ponto de entender que aquele padrão no vortex de luz de seus olhos eram lágrimas.
— Levem-no daqui. Joguem além dos limites da cidade, ou
morrerá. Foi banido do Feudo, e essa terra não o deixará viver. Não deixará que a fruta lhe cure. — Ele convocou a força da primavera, e a beleza de sua raça.
Seus seguranças não seriam capazes de perceber nenhum vacilo em sua voz,
nenhuma fraqueza ou piedade em seus atos. — Levem-no para longe. Para
sobreviver com a vergonha do fracasso e do perjúrio. Que ele seja desonrado por
quebrar o maior dos juramentos, e que viva para ver a promessa de sua corte
escapar-lhe pelos dedos pela mesma fraqueza que o destruiu aqui essa noite.
Nenhum comentário:
Postar um comentário